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Pesquisador do Câmpus Pinheiro orienta artigo sobre a relação entre eventos climáticos extremos e reprodução de peixes na região do Baixo Rio Amazonas

publicado: 16/01/2023 13h00, última modificação: 16/01/2023 17h28
Como resultado da parceria entre engenheiros de pesca das Universidades Federais do Maranhão, do Pará, e do Oeste do Pará, o estudo evidencia como eventos climáticos extremos podem impactar a reprodução de peixes no principal canal do Rio Amazonas

Um estudo, publicado na revista Frontiers in Environmental Science, mostra como eventos climáticos extremos, também conhecidos como El Niño Oscilação Sul (Enos), afetam a reprodução de peixes na região do Baixo Amazonas. A pesquisa, intitulada “Effects of anomalous climatic events on the structure of fish larvae assemblages in the eastern Amazon”, teve a participação do professor e pesquisador do Bacharelado em Engenharia de Pesca do Centro de Ciências de Pinheiro (CCPi) da Universidade Federal do Maranhão Marcelo Costa Andrade

Dado que as maiores buscas da humanidade encontram-se na Amazônia, o estudo foi conduzido no Baixo Rio Amazonas (localizado no norte do Pará), na ilha de Marrecas, como aponta Marcelo Andrade, porque a região apresenta a maior taxa per capita de consumo de pescado do planeta. Assim, torna-se crucial compreender as oscilações do abastecimento de pescado diante das modificações acometidas pelo El Niño Oscilação Sul.

Em livre tradução, o artigo “Efeitos de eventos climáticos anômalos na estrutura de comunidades de larvas de peixes na Amazônia Oriental”, sugere que a incidência de eventos climáticos extremos, adicionados à exploração pesqueira regional, pode afetar negativamente a fenologia e os padrões populacionais das assembleias de larvas em uma curta escala temporal.

O estudo faz parte da dissertação de mestrado do engenheiro de pesca Ruineris Almada Cajado (foto à direita), discente do PPGEAP da UFPA e membro do Laboratório de Ecologia do Ictioplâncton e Pesca em Águas Interiores (Leipai), ligado ao Instituto do Ictioplâncton das Águas da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa). Além dele, também assinaram o artigo o docente da UFMA responsável pela orientação da pesquisa, o engenheiro de pesca Marcelo Andrade, que é pesquisador do Neap; os engenheiros de pesca Lucas Silva de Oliveira e Fabíola Katrine Souza da Silva; e o coorientador da pesquisa o engenheiro de pesca Diego Maia Zacardi, que integram o Leipai da Ufopa.

Na análise do professor Marcelo, o artigo é uma maneira de apresentar as mais diversas formas de como o profissional da engenharia de pesca poderá atuar no campo da biologia pesqueira. “Há muitos pontos-chave que eu poderia destacar de como a publicação desse artigo também poderá ser enriquecedora para o Bacharelado em Engenharia de Pesca da UFMA. O fato mais importante, neste momento, é que a pesquisa é totalmente relacionada com o curso, tendo em vista que analisa os estoques pesqueiros em suas fases iniciais de vida, exatamente na área em que os estudantes da engenharia poderão atuar”, destacou, citando o curso de Pesca do Câmpus de Pinheiro.

Pesquisa para beneficiar a Região Amazônica  

De um jeito bem simplificado, a pesquisa revela como os efeitos climáticos acometem, negativamente, os padrões populacionais dos estoques de peixes no momento em que as larvas apresentam potenciais modificações, devido à pesca comercial de peixes e ao fornecimento de pescados para a alimentação da população.

Nesse processo, segundo detalhou Andrade, foram coletadas larvas de peixes nos anos de 2013 a 2014 e de 2018 a 2019, durante os períodos hidrológicos de enchente, cheia, vazante e seca, no Baixo Rio Amazonas. Posteriormente, as larvas foram classificadas em seus respectivos grupos funcionais, tais como por tipo de migração, estratégia de história de vida, hábito alimentar e uso de microhabitat e/ou posição na coluna de água, em que foram levados em consideração os traços de cada espécie. “As coletas ocorreram durante quatro estações e, com isso, distribuídas aleatoriamente no canal do Rio Amazonas: diuturnamente, das 15h às 18h; e noturnamente, das 20h às 21h. Para isso, foi utilizado uma embarcação numa velocidade reduzida, em que foi arrastado na subsuperfície do rio uma rede de 300 micrômetros de abertura de malha”, detalhou.

Como se vê, a pesquisa mostra que a manutenção da dinâmica hidrológica é indispensável à atividade reprodutiva dos grupos funcionais, com relação à conservação da biodiversidade de peixes no Rio Amazonas. “Foi observado que espécies sedentárias — consideradas intermediárias entre os períodos de seca e cheia, por serem bentônicas, piscívoras e onívoras — são associadas aos elevados índices pluviométricos e altos níveis de água durante o final da enchente ou cheia. Já as larvas de peixes migradores de grande tamanho, além de planctívoros de importância comercial, foram associadas ao período de vazante”, esclareceu.

O estudo é importante e inovador, uma vez que é a primeira pesquisa na Amazônia a estudar a ecologia funcional das assembleias de peixes durante suas fases iniciais, como afirmou. “Pensar do ponto de vista funcional, isto é, da funcionalidade das espécies para o ecossistema, torna-se inovador quando comparado com a tradicional forma de pensar da ótica taxonômica”, acrescentou.

Pensar a partir desse prisma, na visão dele, é avaliar o ecossistema em sua natureza mais completa o possível. “Quando se perde uma espécie devido a um problema ambiental — do ponto de vista tradicional — também perderá uma entidade taxonômica que nunca mais estará ali. Já do ponto de vista da ecologia funcional, essa perda, que não é um evento raro mediante a tantos problemas antrópicos, pode-se dizer que removerá uma função ecossistêmica que, por conseguinte, será cumprida por uma outra espécie que já existe no local, mas sem desestabilizar o ecossistema. Isto é, pensar do ponto de vista funcional, é pensar no ecossistema como um todo, e não em partes isoladas. É daí de onde se tem a inovação do estudo”, exemplificou, minuciosamente.

A superexploração e consequente redução dos estoques naturais

Diante do cenário ambiental do Brasil, o mau estado de conservação da biodiversidade de peixes no Rio Amazonas, onde foi conduzida a pesquisa, é apenas a ponta do iceberg, uma vez que as respectivas políticas públicas para o desenvolvimento do país dividem opiniões e causam preocupações devido aos problemas ambientais ocasionados por implantações de projetos na região. “Aliás, as populações naturais de peixes estão sofrendo globalmente. Isso não está ocorrendo só na Amazônia, tampouco só em nosso país”, lembrou. 

O fator consumo, de acordo com o docente, não é um dos principais impactos negativos desse meio, pois existem outras atividades que são extremamente degradantes para o meio ambiente tais como a perda de hábitat e a poluição aquática. Por isso, a pesquisa foi conduzida de modo a apresentar as variações que ocorrem nas assembleias de larvas de peixes no Baixo Rio Amazonas, exatamente diante dos problemas expostos no estudo.

Na análise do pesquisador, esse estudo não tem a intenção de refrear a atividade pesqueira, porém tem por objetivo mostrar o comportamento das assembleias estudadas mediante os efeitos climáticos anômalos e, consequentemente, como os estoques pesqueiros, significativos para a região, estarão acessíveis às atividades pesqueiras. “A ideia central foi mostrar como as composições das larvas são moldadas mediante esses problemas e, assim, entender melhor como os estoques pesqueiros estarão futuramente”, enfatizou.

Conhecimentos compartilhados

O orientador da pesquisa entende que esse tipo de estudo ajuda a compreender como a reprodução de peixes é moldada pelos efeitos climáticos, haja vista que influenciam no processo reprodutivo e no estoque pesqueiro efetivo que estará disponível para o acesso em atividades pesqueiras. Na opinião dele, há muitas razões para isso, pois, saber como os estoques são moldados também ajuda a traçar medidas eficazes para a proteção de peixes mais sensíveis e/ou que sofreram com o El Niño Oscilação Sul na região. 

Isso porque, entre outros motivos, garantirá que essas espécies não sejam acarretadas ao ápice do declínio populacional, assegurando a perpetuação da atividade pesqueira. “Sabendo quais são os peixes que precisam de maior atenção, será viável propor medidas, tais como a proibição de pesca de determinadas espécies durante alguns períodos do ano, a fim de garantir a manutenção necessária dos estoques pesqueiros”, sugeriu.

Saiba mais

O pesquisador Marcelo Costa Andrade também atua como orientador de pesquisas na graduação de Engenharia de Pesca do CCPi da UFMA, nos programas de pós-graduação em Biodiversidade e Conservação (PPGBC) da UFMA e em Ecologia Aquática e Pesca (PPGEAP), vinculado ao Núcleo de Ecologia Aquática e Pesca da Amazônia (Neap) da Universidade Federal do Pará (UFPA).

Por: Lucas Araújo

Produção: Bruna Castro

Revisão: Jáder Cavalcante

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