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Pela fé

publicado: 02/09/2023 10h10, última modificação: 16/10/2023 10h34
Artigo do reitor

É “setembro amarelo”, mês do combate à depressão e à prevenção ao suicídio. É o mês da Bíblia, esse livro sagrado de poesia, sabedoria, ensinamentos e histórias de fracassos e vitórias humanas, numa narrativa protagonizada pelo próprio Deus que escolhe um povo para se revelar e, através dele, feito Homem sob o nome de Jesus, salvar a humanidade. Escolho pensar sobre as Escrituras porque é um meio de tocar na cura da depressão e de outros males que podem levar a extremos contra a própria vida.

A Bíblia, imperativo para nossa superação nos embates cotidianos, é uma obra fantástica. Impossível não se encantar com relatos antigos de disputas familiares que envolvem perdão e restauração, tão atuais para lidar com as questões pessoais, relacionais e financeiras. Traz descrições de guerras épicas, de sucessões de reis e suas tramas políticas. Traz metáforas dos profetas e em especial os evangelhos que, cada um à sua maneira, fala da vida e das ações de Jesus.

Neste setembro amarelo de 2023, destaco a epístola do apóstolo São Paulo aos Efésios, escrita quando seu autor estava na prisão, perseguido pelo império romano, justamente por propagar a fé cristã. Uma ironia do destino marca a vida do personagem: um pouco antes da remissão dos livros, vemos em Atos dos Apóstolos a conversão do então Saulo, um fariseu que não aceitava a incipiente religião e que alcança fama justamente por perseguir e matar cristãos.
  
De repente, o perseguidor se torna perseguido e passa a ser uma espécie de troféu para cristãos e também para seus opositores. Aos primeiros, exemplo a ser imitado por sua intrepidez e desenvoltura. Aos segundos, problema a ser eliminado, vez que se tornara uma ameaça ao império.  Versado em toda a sorte de conhecimento da lei judaica, poliglota, culto e excelente em oratória, Paulo convertido é um dínamo.


Empreende viagens missionárias para implantar novas igrejas da fé cristã, realiza milagres, expulsa demônios, fala para pessoas de todas as classes sociais como carcereiros e reis, segue conquistando novos adeptos de forma avassaladora, com perigo de vida constante. E, finalmente, quando foi detido numa prisão em Roma, enquanto aguardava o julgamento pelo Imperador César, produz um acervo de epístolas que vieram a integrar o cânon sagrado e que se tornaram uma espécie de manual para aquelas jovens instituições com lições atualíssimas de integridade de fé e ética que alcançam os seguidores da religião cristã também em nosso presente s éculo.

A Epístola aos efésios é uma obra prima em apenas seis capítulos. Em todos eles, seu autor fala da necessidade da unidade entre todos aqueles que professam a fé cristã, no sentido de que, sem esse entendimento, estariam fadados a desaparecerem. Afinal, os ataques de inimigos estavam espalhados em todos os lugares, de forma explícita ou não.

Por isso mesmo, o apóstolo Paulo vai fazer ainda uma espécie de tratado teológico, explicitando questões como armas espirituais de velhas e novas naturezas e também vai abordar questões práticas como relacionamentos familiares e a espécie de tratamento que deveria existir entre as pessoas que se dizem da mesma fé.

Aliás, é sobre a fé defendida pelos cristãos que Paulo diz qual seu papel instrumental: no capítulo 2, diz que é por meio dela, a fé, que acontece o fenômeno da salvação.  E que ninguém, por melhores atitudes que possa ter, não pode alcançar esse fenômeno. E o que seria a fé? Certeza, convicção do invisível, como lembra Santo Agostinho: ter fé é assinar uma folha em branco e deixar que Deus nela escreva o que quiser.

Em Efésios, Paulo faz um comovente apelo para o compromisso firmado pela igreja estabelecida na cidade de Éfeso para que não se esqueça das bases nas quais se firmaram e reconhece que a caminhada é árdua e difícil, mas que não é impossível.

Ao longo dos séculos, esse pequeno livro em sido tema de muita controvérsia e discussão. Obras foram lançadas para análise dos assuntos abordados e diversas linhas teológicas foram levantadas, sendo uma das mais interessantes a abordada por São Tomás de Aquino quando discorre acerca da graça que é repartida por um Deus todo poderoso com sua criação e com o destino de fazê-la se aproximar mais de seu Criador.

A cada leitura da epístola, novas conclusões, novos questionamentos. Mas a mensagem universal permanece incólume para aqueles que abraçam uma forma de existência baseada na fé em Deus que criou e sustenta o universo e todos as criaturas, em todas as circunstâncias que precisem enfrentar para serem mais fortes ainda em tempos de fraqueza.

Natalino Salgado Filho, MD.PhD
Reitor da UFMA
Professor Titular da UFMA
Médico Nefrologista
Membro da Academia Maranhense de Letras
Membro da Academia Nacional de Medicina

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