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Inclusão acadêmica: primeira aluna surda e trans do curso de Teatro se forma na UFMA

publicado: 24/03/2025 09h42, última modificação: 24/03/2025 12h44
Inclusão acadêmica: primeira aluna surda e trans do curso de Teatro se forma na UFMA

A Universidade Federal do Maranhão (UFMA) celebrou o marco histórico na inclusão acadêmica com a defesa do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Thag Santos, a primeira aluna surda e trans a se formar no curso de Licenciatura em Teatro da instituição. A pesquisa, intitulada ‘EU E VÁRIAS EUS: uma pesquisa sobre a construção da performance de uma aluna preta, trans e surda”, aborda as vivências da estudante no ambiente universitário e a construção de sua identidade artística. A conquista acontece no mês de março, simbolizando também a resistência e a força das mulheres na luta por espaços de direito e visibilidade.

Thag ingressou na UFMA pelo Sistema de Seleção Unificada (SISU), utilizando a cota para pessoas com deficiência. Durante sua jornada acadêmica, enfrentou desafios estruturais e metodológicos, mas contou com o suporte da Diretoria de Acessibilidade (Daces) da Pró-reitoria de Assistência Estudantil (Proaes), que acompanhou sua trajetória e ofereceu suporte em diversas áreas, incluindo tradução e interpretação em Libras.

“A Daces, a partir do processo de matrícula dos discentes com deficiência, planeja os atendimentos necessários para cada um. Acompanhamos os estudantes ao longo de toda a jornada acadêmica, garantindo suporte pedagógico, psicológico e social, além de serviços como adaptação de material e empréstimo de tecnologia assistiva. No caso de Thag, a Subseção de Intérpretes de Libras esteve presente em sala de aula, espetáculos, visitas técnicas e atividades do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), sempre orientando professores e coordenação sobre estratégias pedagógicas que evidenciassem suas potencialidades e não sua deficiência”, explicou Roselane Martins, chefe da Subsessão de Interpréte de Libras.

Pesquisa e representatividade no Teatro

A pesquisa desenvolvida por Thag investiga a construção da performance de uma aluna surda, trans e preta no contexto acadêmico, analisando as barreiras enfrentadas e propondo novas perspectivas para o ensino das artes cênicas. Segundo sua orientadora, a professora Michelle Cabral, a presença da estudante no curso trouxe transformações significativas para a comunidade acadêmica.

“A Thag foi minha primeira aluna surda e também a primeira do curso. No início, fomos pegos de surpresa. Meu maior receio era garantir que ela tivesse o mesmo aprendizado que os demais alunos. Mas, como professora, também me tornei aluna e aprendi muito com essa experiência. Foi preciso pensar em novas metodologias que não se limitassem à presença do intérprete, mas que incluíssem outras formas de comunicação para além da linguagem falada”, relatou Michelle.

A relação acadêmica entre orientadora e orientanda se fortaleceu durante o percurso. Além do TCC, Thag também participou do Grupo Pesquisa em Teatro e Circo – Urbanitas, coordenado por Michelle, o que contribuiu para o amadurecimento de sua pesquisa.

“A orientação foi tranquila, pois já tínhamos um vínculo acadêmico. A Thag é extremamente talentosa e desenvolveu um trabalho necessário, analisando sua vivência no curso e as políticas de acessibilidade da UFMA. Seu trabalho evidencia a importância da Daces e de iniciativas como o uso do nome social para alunos e alunas trans, trazendo uma reflexão essencial para a inclusão no ensino superior”, destacou a professora.

Desafios e superações

Ao longo de sua trajetória acadêmica, Thag enfrentou desafios relacionados à comunicação e acessibilidade, mas encontrou apoio em professores e colegas para seguir em frente. “No início, foi tranquilo, pois eu tinha o suporte de um intérprete de Libras familiarizado com o universo artístico. No entanto enfrentei dificuldades, como insegurança para escrever trabalhos acadêmicos e a falta de legendas ou recursos vibratórios em algumas aulas. Felizmente, os professores foram compreensivos, e a Universidade melhorou a acessibilidade ao longo do tempo”, afirmou a estudante.

Para Thag, concluir a graduação é mais do que uma realização pessoal, é um passo importante na luta pela representatividade e pelo direito à educação para todas as pessoas. “O tema do TCC reflete minha vivência como uma pessoa preta, trans e surda no teatro. Sempre me perguntaram como produzo minhas performances e como minha identidade influencia no meu trabalho. O resultado da pesquisa foi positivo porque mostra que essa experiência não é só minha, mas de muitas outras pessoas que enfrentam desafios semelhantes”, explicou.

Ao se tornar a primeira aluna surda e trans a concluir o curso de teatro, Thag espera inspirar outras pessoas a seguirem seus sonhos, independentemente das barreiras impostas. “Fui a primeira, mas não quero ser a única ou a última. Saber que já há outra estudante surda no curso me enche de esperança. Espero que minha história mostre que, com persistência e apoio, é possível superar desafios e construir um futuro melhor”, expressou.

Inclusão no ensino superior 

A UFMA tem avançado na promoção da acessibilidade e na inclusão dos estudantes. A experiência de Thag reforça a importância dessas iniciativas e evidencia a necessidade contínua de adaptações pedagógicas para garantir equidade no ensino. Para Michelle Cabral, o impacto dessa conquista vai além do curso de Teatro. “A Universidade precisa ser um espaço para todos. A presença da Thag nos fez repensar metodologias, atualizar conteúdos e ampliar o olhar sobre a formação, estar a serviço de toda a sociedade, sem distinção”, ressaltou.

No mês da mulher, a trajetória de Thag ganha um significado ainda mais forte: sua presença na Universidade representa a resistência das mulheres que desafiam barreiras e conquistam espaços. Seu exemplo abre caminhos para novas gerações de estudantes surdas e trans, consolidando o compromisso da UFMA com a inclusão e a diversidade.

Por: Geovanna Selma

Produção: Sarah Dantas

Fotos: arquivo pessoal

Revisão: Jáder Cavalcante

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