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ENTREVISTA: Professor Márcio Carneiro fala sobre a conquista de prêmio nacional por pesquisa em jornalismo e big data
O professor e coordenador do Mestrado Profissional de Comunicação da UFMA e docente doutor pelo Programa de Tecnologias da Inteligência e Design Digital da Pontifícia Universidade Católica (PUC), Márcio Carneiro, conquistou, pela segunda vez, o Prêmio Adelmo Genro Filho de Pesquisa em Jornalismo do XX Encontro Nacional da Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor), na categoria Pesquisa Aplicada. A premiação – cuja lista de vencedores foi divulgada pela Associação em 17 de setembro – será entregue durante o evento, que ocorrerá entre os dias 9 e 11 de novembro, em Fortaleza, Ceará.
O Prêmio Adelmo Genro Filho de Pesquisa em Jornalismo foi criado pela Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo em 2004, e tem por objetivo reconhecer as contribuições relevantes para o campo da pesquisa do jornalismo e valorizar a qualidade dos trabalhos acadêmicos produzidos em universidades ou nos centros/institutos de pesquisa que são relevantes para construir e consolidar a identidade do campo científico.
Para falar da conquista, o professor Márcio Carneiro dos Santos, que obteve a premiação pela pesquisa “Jornalismo e Big data – Protocolo de Abordagem e suíte de ferramentas de coleta e análise de dados em grandes volumes para jornalistas e pesquisadores”, concedeu entrevista à Diretoria de Comunicação (DCom) da Superintendência de Comunicação e Eventos (SCE) da Universidade Federal do Maranhão. Confira a seguir.
DCom: No que consiste a pesquisa?
Márcio Carneiro – A gente constata facilmente, no ambiente digital, que tanto jornalistas como pesquisadores da área da comunicação, das humanidades e das ciências sociais têm que, cada vez mais, lidar com grandes volumes de dados que estão nas plataformas de mídias sociais e nos portais de transparência. Hoje, quem está pesquisando e levantando dados, seja como jornalista ou pesquisador, tem que lidar com grandes volumes de dados, variedade de dados que são gerados com uma velocidade muito grande.
São três características que a gente normalmente associa ao termo big data: velocidade, variedade e volume. Quem lida com isso nem sempre está treinado e adaptado para enfrentar essa situação, que é uma situação cada vez mais frequente. Então, esse é o principal problema que a pesquisa tenta atacar, ou seja, criar e popularizar metodologias e protocolos de utilização para ajudar pesquisadores e jornalistas a lidar com grandes volumes de dados e com grandes massas de texto também. Por exemplo, eu tenho um pesquisador, e ele quer entender uma determinada questão e para isso ele está usando os posts do Twitter dentro de uma trend, então a gente está falando de um cara que vai ter que lidar com mil, dez mil, um milhão de posts, é uma massa de texto muito grande que inviabiliza poder fazer esse levantamento manualmente, ele até consegue fazer, mas, por mais esforçado que seja, ele não vai acessar nenhuma parte razoável disso.
Essa pesquisa é voltada para desenvolver um protocolo, ou seja, um caminho para ensinar essas pessoas e possíveis usuários a lidar com esse tipo de situação. E, além disso, algumas ferramentas, ou seja, alguns algoritmos e códigos, que a pessoa não vai ter que desenvolver, ela vai utilizar pra fazer isso, algoritmos que trazem algumas soluções de inteligência artificial, mais especificamente da área de processamento de linguagem natural, que é a área que lida com o texto e com dados não estruturados, para que você, por exemplo, numa massa enorme de textos, possa automatizar, por exemplo, uma identificação de tópicos que se destacam nessa massa de texto. A pesquisa se traduz nesse esforço de fazer essa ponte interdisciplinar decorrente de uma necessidade de jornalistas e pesquisadores, que é lidar com situações em ambientes digitais com muito volume de dados.
DCom: Que resultados foram obtidos até agora?
MC - Essa pesquisa ainda não foi encerrada, ela está em andamento. Eu venho trabalhando nessas soluções, neste protocolo e, inclusive, já tenho algumas publicações desde 2016, mas, de 2019 pra cá, eu comecei a desenvolver os códigos e algumas coisas para uso próprio. E agora estou querendo, vamos dizer assim, organizar essas coisas em uma caixinha de ferramentas mais estruturada, para que outros possam usar também.
Essa pesquisa foi contemplada agora no edital universal da Fapema, então ela, oficialmente, vai até 2024 e gente vai usar esse tempo e esse financiamento extra da Fundação para avançar nesses objetivos. A pesquisa não está terminada, e algumas coisas já foram feitas, mas ainda há muito o que fazer.
DCom: Quais as abordagens do trabalho e o objetivo principal?
MC - É a abordagem da pesquisa aplicada, pesquisa orientada à solução de problemas reais, à inovação e ao desenvolvimento de produtos. O nosso mestrado profissional é, por força do documento de área da Capes, um mestrado que prioriza pesquisa. O discente entra no programa apresentando um projeto para desenvolver uma solução ou um produto. Às vezes, as pessoas pensam que são coisas muito sofisticadas, muito difíceis, mas não, às vezes um protocolo é um produto, um conjunto de normas ou de recomendações, é um produto, não precisa ser um site, uma base de dados. É algo que vai ajudar um conjunto de beneficiários, que enfrenta uma situação problemática em que o produto, a solução vai ajudar ou pelo menos minimizar o problema. Isso é pesquisa aplicada de uma forma bem prática e é o caminho em que a gente acredita e pelo qual a gente trabalha diariamente.
DCom: Como você classifica a importância da pesquisa para o cenário atual do jornalismo?
MC - Existem hoje, nas redações e nas assessorias, muitos profissionais que não foram treinados, ou seja, na graduação, quando fizeram a sua formação original, não existia ainda esse cenário de tanto excesso de informação, e, às vezes, quem formou em um período pré-digital, analógico, ou no período em que redes, computadores e plataformas de mídias sociais ainda não tinham essa centralidade que têm hoje. Essas pessoas, na formação original, não foram treinadas pra isso, então hoje elas sentem grande dificuldade.
Na graduação, eu treino os meus alunos. Por exemplo, você acessa um portal de transparência de um site de governo e vai lá atrás de dados, atrás de histórias que, às vezes, estão naqueles números ou naquelas informações, e se você não sabe lidar com uma planilha ou fazer operações básicas, como um filtro, você já vai ter uma certa dificuldade, então esse treinamento é importante.
Estou levando isso para um outro nível, para situações um pouco mais complicadas, com mais volumes e, como eu falei, com grandes massas de texto, abrindo esse leque não só para jornalistas, mas também para pesquisadores, principalmente da área de ciências sociais aplicadas e humanas, que também, na sua formação, seja especialização, mestrado ou doutorado, não têm esse treinamento mais específico, que estão um pouco afastados ainda e distantes de entender o potencial que esse recurso computacional, principalmente ferramentas de inteligência artificial, podem ajudar nesse trabalho, nesse contexto que eu estou falando de excesso.
Então eu vejo como importante, é uma colaboração para pessoas. Eu sou jornalista, sou pesquisador, entendo que essa é uma questão que incomoda, e que as pessoas têm necessidade disso e eu estou tentando ajudar com o trabalho.
DCom: Quais os próximos passos da pesquisa?
MC - Para 2024, é organizar mais os algoritmos, as interfaces, e a utilização para a experiência do usuário ser mais tranquila, a pessoa não vai precisar saber programar. São ferramentas que a gente precisa ainda aperfeiçoar, e espera fazer isso ao longo desse tempo.
E o próprio protocolo, que não é uma ferramenta em si, é uma forma de agir, uma forma de abordar, uma metodologia dentro da área de métodos digitais, que é onde eu trabalho, e que vai como uma espécie de guia, com passo a passo pra você ver, porque há situações diferentes, por exemplo, você tem um portal de transparência de um governo que é um ponto de publicação na web e que foi criado para prover dados, que, então, fica mais fácil.
Você, às vezes, tem dados, conteúdos que estão em sites que não foram projetados para servir dados, então você tem que chegar a esse lugar de um outro jeito, vai usar scraping, que é uma técnica de raspagem de dados. Em plataforma de mídias sociais, você já vai ter que lidar com uma API, que é uma interface própria daquela rede, como Twitter e Facebook, uma espécie de língua que você tem que falar para poder conversar com a API e extrair dela alguma coisa, então são caminhos diferentes, e a pessoa tem que entender.
Essa é a ideia do protocolo, de colocar pelo menos um guia para ver que, às vezes, as situações da origem dos dados são diferentes, e indicar como você deve abordar esse ponto de publicação e como você aborda cada caso. Esse é o objetivo final, organizar esses caminhos para jornalistas e pesquisadores.
DCom: Qual a sensação de ser premiado pela segunda vez na categoria Pesquisa Aplicada?
MC - Com a premiação claro que a gente fica feliz, é o meu trabalho e o que eu faço, eu me dedico para isso, então gera uma felicidade. Mas ainda mais importante é a premiação para a categoria da pesquisa aplicada.
O Prêmio Adelmo Genro Filho, que é o Prêmio Nacional mais antigo, é dado pela SBPJor, que é a Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo e a maior instituição acadêmica focada no objeto dos estudos do jornalismo. Então, claro que é uma alegria receber esse prêmio, mas essa categoria de Pesquisa Aplicada é mais recente, ela foi criada há quatro anos, e, no seu primeiro ano, eu recebi a premiação com um trabalho sobre realidade virtual, que hoje em dia está muito comum o termo meta versa, mas, quatro anos atrás, eu já estava trabalhando com isso e recebi esse prêmio, e agora recebo de novo, claro que com muita felicidade e fico feliz pela própria categoria, que a gente sabe que precisa ser aplicada na área do jornalismo e ainda é um nicho e que ainda causa esse estranhamento em relação até aos próprios colegas.
Então toda coisa que acontece ao redor da pesquisa aplicada, que é a pesquisa que busca solução para problemas reais, que busca impacto social, que busca fazer diferença, que é orientada à inovação, é um tipo de pesquisa fundamental nos dias de hoje. O mundo vai ficando mais complexo, então a gente precisa também de novas soluções.
Eu vejo com muita felicidade, antes até do meu próprio nome ou do meu próprio prêmio, a gente ter a pesquisa aplicada, acho que a SBPjor nesse aspecto está sendo, mais uma vez, inovadora, porque há muita associação científica que ainda não olha para a pesquisa aplicada como deveria, e eu acho que ela está na vanguarda. É bom, toda vez que acontece um prêmio desses, a gente ter a oportunidade de falar mais sobre pesquisa aplicada, falar mais sobre inovação na academia, e acho que isso é bem legal.
Além claro de ser também um prêmio não só para mim, mas também ao Labcom, que é o laboratório que eu coordeno; ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação, nosso mestrado profissional em comunicação, que eu estou coordenando agora, e à própria UFMA, que tem excelência em seus trabalhos, não só na área de comunicação, mas em várias outras áreas. Então é um trabalho conjunto, é um tijolinho dentro desse esforço coletivo de formação de recursos humanos e formação de pesquisadores que a gente faz aqui na Universidade.
DCom: Pode nos falar sobre seus próximos passos pessoais após a premiação?
MC - A premiação foi divulgada, e os premiados foram divulgados, mas a premiação ocorre no evento da SBPjor, que vai ocorrer na Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, de 9 a 11 de novembro. Então vamos receber, claro, muita alegria em nome do Labcom, em nome PPGCOMPro, em nome da UFMA. E vamos continuar trabalhando, na formação de recursos humanos, na formação de pesquisadores e para o desenvolvimento de ferramentas de metodologias de soluções.
Vamos continuar dando a nossa colaboração no desenvolvimento da pesquisa para que ela possa crescer na nossa área do jornalismo, na área da comunicação, porque a gente entende que ela é fundamental nesse mundo aí cheio de problemas e de dificuldades. As pessoas precisam de soluções, e a gente quer ajudar com isso.
Por: Natália Paulo
Produção: Bruna Castro
Revisão: Jáder Cavalcante