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DIA NACIONAL DA VISIBILIDADE TRANS

Do acesso à permanência: UFMA reforça o espaço de equidade para pessoas trans na instituição

publicado: 29/01/2025 09h01, última modificação: 29/01/2025 10h11
Do acesso à permanência: UFMA reforça o espaço de equidade para pessoas trans na instituição

Comemorado no dia 29 de janeiro no Brasil, o Dia Nacional da Visibilidade Trans é um marco que promove reflexões sobre cidadania e celebrações do movimento contra as discriminações por identidade de gênero de pessoas trans, travestis e não binárias desde 2004, quando foi realizado o ato nacional “Travesti e Respeito” no Congresso Nacional, em Brasília.

A presença de pessoas trans em instituições de ensino superior é um passo essencial para garantir que a diversidade de vivências seja representada na produção de conhecimento. Mais do que uma conquista individual, essa representatividade ajuda a desconstruir estigmas e promove uma educação mais inclusiva, que reflete as múltiplas identidades da sociedade e enriquece o cenário acadêmico.

Alinhada a esse objetivo, a Universidade Federal do Maranhão (UFMA) criou, em 2024, a Diretoria de Diversidade, Inclusão e Ação Afirmativa (DIDAAF), cujo objetivo é elaborar e executar políticas voltadas para garantir a inclusão e a diversidade para a comunidade universitária, incentivando o exercício livre da cidadania no ambiente acadêmico entre os discentes, docentes e servidores de diferentes etnias, orientações sexuais, religiões e identidades de gênero.

Políticas de inclusão voltadas para pessoas trans não apenas asseguram direitos básicos, mas transformam a sociedade ao fomentar debates sobre igualdade, diversidade e respeito. Quando essas ações se consolidam em espaços educativos, criam-se condições para que indivíduos historicamente marginalizados tenham acesso a oportunidades que antes lhes eram negadas.

Na UFMA, as políticas de inclusão são implementadas por meio de decretos e resoluções que garantem o acesso e a permanência de pessoas trans na instituição. Desde 2015, a UFMA assegura, por meio da Resolução nº 242-CONSUN, que servidores, estudantes e usuários da instituição, cuja identidade de gênero não corresponda ao nome registrado em seus documentos civis, possam utilizar e incluir seu nome social nos registros oficiais e acadêmicos da UFMA. Desde a implementação, 62 discentes da graduação e 78 da pós-graduação optaram pelo nome social no ato da matrícula. 

Além dessa medida, outra iniciativa afirmativa é regulamentada pela Resolução nº 3.058 do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONSEPE). Essa normativa prevê a reserva de vagas específicas em editais de cursos de pós-graduação, seja no formato stricto ou lato sensu, para pessoas trans, reforçando a inclusão dessa comunidade no ambiente acadêmico.

Para além disso, a DIDAAF reforça essa política ao propor o mapeamento e a promoção de debates relacionados à identidade de gênero. O diretor da DIDAAF, Acildo Leite, explica que está em andamento um processo de levantamento de dados sobre a população LGBTQIA+ na Universidade. “Estamos, em primeiro momento, fazendo levantamento de todos os alunos e alunas que estão na Universidade e que fazem parte da comunidade LGBTQIA+. Essa é a primeira ação que estamos realizando para mapear e saber em quais cursos esses discentes estão, e avançarmos nas políticas de valorização da diversidade sexual dentro da nossa instituição”, afirma Acildo.

Além do mapeamento de discentes trans na Universidade, o coordenador também salientou a intenção da Diretoria de mapear os grupos de pesquisa que abordam a temática da diversidade de gênero na UFMA, destacando a multidisciplinaridade das produções científicas realizadas neste escopo e o intuito de transformar a Universidade em um espaço mais inclusivo.

De acordo com o diretor, entre os planos da DIDAAF está o avanço na execução de processos formativos com o objetivo de solidificar o debate de gênero no ambiente universitário, com a realização de campanhas informativas. “Aqui temos estudo, pesquisa. Esse é um campo bastante profícuo na produção de conhecimento. Temos pesquisadores renomados que desenvolvem pesquisa sobre a diversidade sexual e de gênero. Queremos somar a isso e criar um programa afirmativo de uma UFMA mais diversa, onde também possamos colaborar com toda a comunidade universitária, incluindo servidores e professores.”

O combate à transfobia começa com a educação, que tem o poder e o propósito de mudar mentalidades e construir pontes entre diferentes grupos sociais. Espaços educacionais precisam ser locais de acolhimento e respeito, onde discussões sobre identidade de gênero e diversidade sexual sejam promovidas com seriedade e empatia.

Uma das pesquisadoras da UFMA, a professora do Câmpus de Pinheiro da Universidade Rarielle Rodrigues, é também coordenadora do Grupo de Estudos de Gênero, Memória e Identidade (Geni), que promove debates, realiza eventos, desenvolve pesquisas e produz conhecimento acadêmico ligado à temática de gênero desde 2001.

O Geni é um dos grupos da UFMA que se consolida como um espaço de abordagem inclusiva de gênero, levando luz a temas como transmaculinidades, transfeminismo e afeminofobia. Tendo seu nome associado à canção de Chico Buarque “Geni e o Zepelim”, o grupo é coordenado por Rarielle desde 2021.

A professora, que reconhece a importância da inclusão e permanência da população trans na educação formal desde o ensino básico, destacou o valor de uma trajetória escolar consistente para os alunos trans, bem como do acesso e prosseguimento, por essa parte da comunidade acadêmica, à Universidade. “O primeiro ponto é combater o discurso transfóbico, deslocar do lugar fantasmático que sempre colocam o gênero. Ao visibilizarmos as experiências, as especificidades da comunidade trans e seus interesses, conseguimos ser mais eficientes, projetando as realidades encontradas para a construção de uma política pública que faça sentindo e atenda às demandas solicitadas, pelo simples fato de ouvir e sistematizar”, pontua a coordenadora.

Do interesse do Geni em investigar como as relações de gênero e sexualidade têm sido abordadas nas ações da Universidade, surgiu a ideia da construção de um levantamento das produções sobre as políticas adotadas pela UFMA e suas aplicações nos cursos de ensino superior. “É uma pesquisa em estágio inicial. Mapear e conhecer é um passo importante para identificar os impactos das ações e em que níveis essas ações são efetivadas. Além de possibilitar a construção sistemática dos acionamentos que podem ser realizados pela comunidade. A principal política é a formação para o letramento de gênero e identidades trans: combater a discriminação pelo conhecimento. Consolidar espaços de escuta e debate sobre o tema, além de tencionar os currículos para esses atravessamentos”, observa Rarielle.

Direito ao nome social na instituição

Desde 2015, alunos e servidores trans da UFMA podem utilizar o nome social também nas premissas da Universidade. A partir da Resolução nº 242, regulamentada pelo Conselho Universitário (CONSUN), é um direito assegurado aos solicitantes o requerimento e adesão ao nome social, bem como a alteração do prenome e de gênero nos sistemas da UFMA. Como consta no documento: “o nome social será o único exibido em documentos de uso interno tais como: diários de classe, fichas e cadastros, formulários, listas de presença, divulgação de notas e resultados de editais”. No histórico escolar, documentos, certificados, declarações e diplomas, o nome social aparece em destaque.

A respeito do nome social, o diretor da DIDAAF reforça que “toda pessoa trans tem direito de requerer e passar a utilizar o nome social nas relações de convivência, tanto na sociedade como no ambiente universitário. Não é um processo burocrático. Tanto na matrícula quanto na sala de aula, todos têm obrigação de reconhecimento e de tratamento com o nome social da pessoa, mesmo que não conste no registro de nascimento ou identidade”.

A solicitação do nome social e da mudança de prenome pode ser feita tanto no momento da matrícula quanto posteriormente, on-line via Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas (SIGAA) ou por meio de requerimento que pode ser entregue nas coordenações de curso de graduação e pós-graduação da Universidade.

Políticas de acesso à pós-graduação

Além da opção de adesão ao nome social, outra ação afirmativa voltada para pessoas trans na UFMA é regida pela Resolução nº 3.058 do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONSEPE), que determina a reserva de vagas nos editais dos cursos de pós-graduação stricto ou lato sensu também para essa parcela da comunidade acadêmica. “A comprovação do candidato é feita também de forma diferente: é exigida uma declaração que pode ser dada por uma instituição do movimento social LBGT, ou o encaminhamento da declaração de três testemunhas que certifiquem que o(a) candidato(a) pertence àquele grupo dentro do qual está sendo pleiteada a vaga”, elucida o diretor da DIDAAF.

Nos termos da Opinião Consultiva n. 24/17 da Corte Interamericana de Direitos Humanos, orientação sexual e identidade de gênero são "direitos constitutivos das pessoas; possuem valor instrumental para o exercício de outros direitos e estão intrinsecamente relacionados com a dignidade do ser humano, como o direito à vida, com o princípio da autonomia da pessoa e com direito à liberdade de expressão, sendo o seu reconhecimento pelo Estado de vital importância para garantir o pleno gozo dos direitos humanos pelas pessoas trans”.

Para que políticas públicas voltadas à inclusão de pessoas trans sejam eficazes, é fundamental ouvir diretamente as demandas dessa população. Espaços de escuta e participação ativa garantem que as ações implementadas tenham impacto real e transformador, promovendo uma sociedade mais justa e igualitária. A UFMA está comprometida com iniciativas que construam o futuro de uma universidade mais equitativa e alinhada com os direitos humanos.

Por: Lucas Cássio* e Geovanna Selma 
*Uma das pessoas autoras dessa reportagem é trans

Produção: Sarah Dantas

Revisão: Jáder Cavalcante

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