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“O povo preto é um povo de excelência”: Hoje, 20 de novembro, é o Dia Nacional da Consciência Negra e de Zumbi dos Palmares
No ano de 1695, morria Zumbi, o líder do Quilombo dos Palmares, localizado na região nordeste do Brasil, entre os estados de Pernambuco e Alagoas. Em sua homenagem, hoje, mais de 300 anos depois, comemoramos o Dia Nacional da Consciência Negra e de Zumbi dos Palmares, oficialmente instituído pela Lei nº 12.519.
Após historiadores da década de 70 descobrirem a data de sua morte, 20 de novembro do referido ano, diversos movimentos se mobilizaram em prol de eleger Zumbi como uma referência e inspiração de luta e resistência do povo negro, no período da escravatura. Lembrar e celebrar o combate à opressão sofrida foi a forma encontrada por muitos para que se opusessem ao apagamento de suas histórias, culturas e tradições.
De acordo com o professor do Departamento de Educação da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Acildo Leite da Silva, a primeira celebração ocorreu em 1971 e, desta data em diante, a ideia se espalhou por outros movimentos sociais de luta contra a discriminação racial e pela conquista do “Dia Nacional da Consciência Negra" como o dia nacional de todos os brasileiros e brasileiras que lutam por uma sociedade de fato democrática, igualitária, mais equitativa na distribuição de direitos e de combate às desigualdades e do racismo.
As comemorações, dessa forma, tem propagado reflexões sobre as adversidades sofridas ao longo da vida de pessoas negras, em uma sociedade que presencia o racismo estrutural. Esse momento marca o fruto de políticas de conscientização e reflexão em defesa dos seus direitos, fazendo com que seja possível aprender como a cultura negra enriqueceu a formação do país.
O docente também diz que essa ocasião traz, para o centro da reflexão, a discussão acerca da afirmação “lugar de negro e negra é em todo lugar”, contribuindo assim para reverter e descontruir representações negativas da pessoa negra nos mais diversos espaços sociais, midiáticos, histórico, nas obras didáticas e literárias, por exemplo, no qual o não enfretamento dessas representações da pessoa negra, acabam perpetuando essas ações de negação simbólica bem como as diversas formas de violência sobre o corpo negro quando não se reconhece e valorizam histórias e culturas.
Apesar das diversas conquistas, muitas barreiras ainda precisam ser ultrapassadas. “O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) lançou o estudo “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça” que mostra que pretos e pardos, que estão no patamar de 57% da população brasileira, têm os piores indicadores de renda, moradia, escolaridade, serviços, entre outros. Quando analisamos o Atlas da Violência 2020, percebemos que a taxa de homicídios entre negros cresceu 11,5% e de não negros caiu 12%. Ao todo, os negros somam 75,9% dos assassinados, ou seja: para cada indivíduo não negro morto, 2,7 negros são assassinados. A taxa de analfabetismo entre negros era de 9,1%, cinco pontos percentuais superior à da população branca. A taxa de negros fora das escolas chega a 19%.
Para o professor, algumas medidas precisam ser tomadas e melhoradas de imediato. Veja algumas:
– Políticas de inclusão de acesso à educação em seus diferentes níveis, promovendo progressão escolar, rendimento, empregos, acesso à moradia e outros benefícios;
– Políticas de acesso e permanência da população negra ao ensino superior, acarretando crescimento expressivo da participação destes dentro das universidades;
– Inserir, nas escolas, as questões raciais, debatendo a problemática do racismo e a valorização da cultura e história do povo negro;
– Valorizar a pluralidade cultural na escola, enfrentado a exclusão e evidenciando o quanto a escola deve ser plural;
– Incorporação de temas relacionados à história e cultura afro-brasileira e indígena em diversos aspectos do currículo escola, gerando discussões e reflexões perceptíveis referentes aos povos afrodescendentes;
– Criar projetos que abordem a temática das relações étnico-raciais, para valorizar a cultura e os povos africanos e afro-brasileiros, apresentado teatro, música, vídeos, discussões, debates acerca do ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana.
Acildo considera que o ensino e a educação se apresentam com a potencialidade de fazer esse enfrentamento, assim como garantir a implementação dessas mudanças e melhorias. “Em uma sociedade ‘não basta não sermos racistas: é preciso sermos antirracistas’. A Universidade precisa ser antirracista, combater o racismo ativamente com ações afirmativas e fazer dessa prática de desconstrução da naturalização do racismo, um compromisso diário”, afirmou.
O professor também deixou um recado final de incentivo: “A minha esperança e crença é que a compreensão de todos esses o processo de discriminação racial, na sociedade, nas escolas e Universidades, nos ajuda enquanto seres humanos, educadores e educadoras a transformá-los em um poderoso instrumento de conhecimento e comprometimento no engajamento de brasileiros na luta antirracista e na construção do Brasil de todos: negros- pretos e pardos, branco, indígena e amarelos”, finalizou.
Dentro da Universidade, essa consciência já se manifesta. Emerson Diniz (25) é um desses exemplos. Homem preto, quilombola e discente do Curso de Comunicação Social da UFMA, Emerson afirma que o processo do reconhecimento e conquista de espaço por pessoas pretas significa uma guerra diária. Para ele, falar de consciência é falar de luta. “O 20 de novembro é um dia que, assim como tantos outros, deve servir para reconhecer a importância de se lutar pelo direito de sermos quem nós somos. Nós somos um povo lindo, nós somos um povo inteligente, nós somos pessoas capacitadas, nós somos pessoas dotadas de habilidades incríveis, nós estamos nos espaços políticos, nos espaços sociais, nos espaços de luta, nós estamos nos espaços de trabalho, nós estamos nos altos cargos também e nós somos bons no que nós fazemos. O povo preto é um povo de excelência. Antes de se falar sobre beleza, nós já éramos belos; nós somos muito potentes naquilo que nós nos propomos a fazer”, pontuou Diniz.
O multiartista maranhense, roteirista e diretor do documentário “A nossa festa já vai começar”, documentário ganhador do 46º Festival Guarnicê de Cinema, também partilha das ideias de Emerson. Em sua perspectiva a celebração da data é de extrema importância, mas insiste em reafirmar que esse é um movimento de dedicação diário. “É comum as pessoas falarem que o Dia da Consciência Negra é todos os dias, porque realmente é isso. Ao longo da vida e da história, tivemos que enfrentar apagamentos, discriminação, racismo. Acredito que é um dia de muita importância, representação de uma conquista muito grande”, finalizou Cadu.
Por: Júlio César
Produção: Bruna Castro