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Entre o céu e a terra

publicado: 10/06/2022 10h06, última modificação: 13/06/2022 17h20
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Arte, cultura, literatura, religião e teologia: uma tarde tanto de mais uma edição do Simpósio Academia Fides et Ratio, quanto de muito conhecimento e aprendizado, desta vez com a temática Arte Sacra, a qual marcou o último dia 28 de maio. Os simpósios estão acontecendo como eventos comemorativos dos dez anos da Academia Fé e Razão, sempre com temas relevantes para a atualidade.

Foram palestrantes do evento: Fernandes Elias Jr. – membro da Comissão do Patrimônio Cultural e Religioso da Arquidiocese do Rio de Janeiro e bacharel em história e bens culturais da igreja – e o artista sacro Romolo Picoli Ronchetti, pós-graduado em Arquitetura Sacra e bacharel em Filosofia. A transmissão ficou a cargo da Web TV Redentor.

Ambos relataram um pouco de suas experiências e vivências com o elemento fundante para quem se dedica a estudar a arte sacra, que não existe de forma exclusiva e desvencilhada do contexto que a cerca. Em função disso, uma igreja, por exemplo, possui vários elementos que se articulam em unidade com a imagem do altar, o ícone mais importante. Ela compõe o todo com a arquitetura que leva em conta o ato de devoção a ser praticado, com os vitrais que retratam as cenas de fé; com o teto, com todas as paredes e pisos que completam a estrutura, numa ambiência de orações que retiram o devoto de sua realidade concreta e o elevam a uma abstração espiritual.

Outro interessante conceito condutor da discussão foi o da mistagogia, palavra que vem do grego e que remete à ideia de um saber necessário para introduzir o leigo no ambiente dos mistérios, aproximando-o do sagrado. Os que vivenciam a liturgia religiosa e já avançaram nessa caminhada são, em alguma medida, mistagogos de sua fé em relação aos iniciantes.

A partir de suas experiências, os palestrantes ecoaram sintonia ao relatar que a arte sacra não tem um fim em si mesma: sempre aponta para algo maior. É um convite à contemplação do que é indescritível. Por isso mesmo, não é qualquer objeto ou produto que pode ser chamado de sacro. A diferenciação reside no fato de que o sacro é um meio, uma mensagem, conectado com o propósito para o qual conduz o espectador a ser partícipe.

Um dos grandes expoentes da arte sacra no Brasil é Claudio Pastro, hoje reconhecido internacionalmente e autor de diversas obras relevantes. “Minha escola, a mais eficiente, sempre foi e é a liturgia, a participação nos sagrados mistérios e tudo o mais que dela decorre”, sintetizou o artista, que trabalha em objetos e espaços litúrgicos, ilustrações de livros e vitrais.

Não à toa, nos evangelhos, Jesus vai alertar: “quem tem ouvidos para ouvir, ouça”. Não é simplesmente o aparelho auditivo natural do qual muitos seres humanos são dotados. É uma inclinação, uma vocação, um despertamento para entender certos sentimentos e devoções.

Um dos maiores poetas brasileiros, Manoel de Barros, entendeu essa verdade a seu modo. Em sua poesia, “Livro sobre nada”, ele constata: “não pode haver ausência de boca nas palavras: nenhuma fique desamparada do ser que a revelou.”     

A arte sacra é essa expressão, em suas múltiplas aparições, do mistério - do indizível. Muito pouco pode ser traduzido, mas, de alguma forma, pode ser acessado pelo sentimento de fervor.

Do Antigo Testamento ao Novo Testamento, até a manifestação dos sacramentos praticados pela religião, a arte sacra é esse fio condutor a aproximar céu e terra, humano e divino.


Natalino Salgado Filho, MD.PhD
Professor Titular de Medicina da UFMA
Chefe do Serviço de Nefrologia do Hospital Universitário da UFMA
Coordenador da Pesquisa Clinica em Nefrologia do HUUFMA
Coordenador da Liga de Afecções Renais do HUUFMA
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